“Vivo para
florescer outros jardins e, sem perceber, o meu se abarrota de rosas e
manacás... Vivo, cada dia, como se fosse cada dia. Nem o último nem o primeiro
- O Único..." ( Pablo Neruda )
Neste 22 de março de
2020. A histeria e o medo tomaram conta dos brasileiros devido à proliferação
do coronavírus. Depois de alguns dias confinado no meu apartamento resolvi sair
para tomar sol e dar uma volta pelo jardim que circunda o condomínio.
Nunca antes tinha
percebido o quanto é lindo o nosso jardim. Sabia que estava num ambiente
agradável, por diversas vezes passei, algumas outras parei para apreciar o
ambiente e conversar com os vizinhos ou acompanhar a minha neta brincando no
parque. Mas, em nenhum desses momentos eu tive a sensibilidade para perceber
detalhadamente as plantas, os lindos jardins, as sombras, as flores, as cercas
vivas, os arbustos, as árvores, a calçada de pedras, os brinquedos e estruturas
de madeira que os suportam, o balanço dos galhos ao vento, os cantos dos
pássaros, a piscina, os caminhos, o lago artificial bem conservado e limpo, os
peixes, o ambiente natural em volta, o estacionamento, os carros estacionados...
Eu estava sozinho, sem a companhia de
ninguém, apenas eu a contemplar o lindo jardim.
“Nos jardins da
vida abrem-se as flores que enfeitarão seus momentos de felicidade,
principalmente se elas forem regadas com o mesmo carinho que embeleza sua vida.
” (Jader Amadi)
Tudo porque devíamos
manter distância das pessoas nestes dias de coronavírus, algumas pessoas que
saíram dos seus apartamentos, ou chegavam ao condomínio, pareciam assustadas, e
quando nos víamos tentávamos ignorar a presença uns dos outros, para não correr
o risco de surgir uma conversa e, estando próximos pudéssemos contaminar ou ser
contaminado pelo vírus mortal transmissor do Covid -19.
De longe observava as
pessoas deitadas nas redes das varandas dos apartamentos vizinhos, outros que
entravam e saiam com seus veículos sempre apressados, uma senhora engomando
roupas, uma garrota no 8º andar de um dos prédios próximos espirrou três vezes,
ainda que muito distante já me assustei (pode tudo menos escutar um espirro ou
tosse que logo vem o desespero).
Em seguida, surgiu um
senhor acompanhado pela esposa e dois filhos, a quase dez metros de distância,
sem usar máscara respiratória; deu um espiro, quando eu caminhava tomando sol,
mesmo de costa para ele e no sentido contrário ao vento, fiquei preocupado, mas
segui a minha caminhada, observando a beleza do ambiente que me rodeava, e o
comportamento das pessoas diante da pandemia. Estávamos todos loucos e
amedrontados, só queríamos manter distância das pessoas, ao mesmo tempo em que
precisávamos do acolhimento e da palavra amiga de alguém, porém as
circunstâncias não permitiam.
Ainda de longe não me
contive quando vi um rapaz parado no estacionamento próximo de um carro, mantinha
a porta do veículo aberta e olhava para o telefone, parecia estar lendo ou
enviando uma mensagem, mantinha sobre o teto do carro um copo amarelo que não
sei o que continha. Julguei que seria cerveja, mas não posso afirmar.
Me atrevi a dar bom dia
ao desconhecido, e mesmo à distância de mais de oito metros um do outro
começamos a conversar em voz alta sobre o momento de isolamento, medo,
histeria, oportunismo político e da necessidade de reagirmos diante do problema
e não deixar que a vida pare, que o país pare, senão entraremos numa crise
econômica que poderá trazer desemprego, fome, doenças e consequências piores
que a causada pelo coronavírus.
Nem oito, nem oitenta! Se
não reavaliarmos e atuarmos de forma consciente ainda que mantendo distância
das pessoas e controlando a propagação do vírus poderemos perder o controle do
país. O mundo não pode parar, o Brasil não pode parar, nós não podemos parar de
forma desordenada sem avaliar com profundidade os possíveis efeitos. Ao final
da conversa me identifiquei e perguntei o nome do anônimo a quem me dirigi.
Respondeu-me Rodrigo. Trocamos um sorriso e nos despedimos.
“Encontros
preciosos não são necessariamente os que nos trazem jardins já floridos. São,
um bocado de vezes, aqueles que nos ofertam mudas...” (Bárbara Coré)
Seguimos cada um para o
seu destino, eu continuei a caminhada a passos curtos, tomando sol ao meio dia,
não muito aconselhado, mas necessário e oportuno.
Valeu o rápido passeio
pelo estacionamento e jardim do condomínio. Descobri que tenho um lindo jardim
ao meu lado e que preciso contemplá-lo por mais vezes com um olhar sensível de
poeta e, a sensibilidade auditiva de um morcego. Com mais tempo e paciência de
um monge, não apenas durante o confinamento obrigatório devido a uma pandemia. Há
males que veem para o bem!
Que Deus nos livre do
coronavírus e proteja a nossa vida dando-nos saúde para viver intensamente cada
segundo, acolhendo as pessoas que amamos, cheirando as flores no jardim,
escutando o canto dos pássaros nos bosques e percebendo a beleza da natureza
bela que que nos rodeia.
Pare para observar o
jardim à sua volta. Tire um tempo para cheirar as flores e escutar o canto dos
pássaros. Viva a vida! Viva a natureza! Viva o lindo jardim!
“Quem não tem jardins por dentro,
não planta jardins por fora e nem passeia por eles...” (Rubem Alves)
José
Carlos Castro Sanches
É
químico, professor, escritor, cronista e poeta maranhense.
São Luís,
22 de março de 2020.
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